Na decisão em que determinou o uso de tornozeleira eletrônica por Jair Bolsonaro (PL), o ministro Alexandre de Moraes escreveu que considera inconstitucional a anistia a atos relacionados à trama golpista, projeto que está na Câmara dos Deputados e que hoje representa a principal bandeira política do bolsonarismo.
O STF (Supremo Tribunal Federal) é a mais alta corte do país, responsável principalmente por resguardar a Constituição de 1988.
Em sua decisão, Moraes diz não haver dúvida de que Bolsonaro e seu filho Eduardo pretendem forçar o engavetamento da ação penal da trama golpista, “seja por meio de uma inexistente possibilidade de arquivamento sumário, seja pela aprovação de uma inconstitucional anistia”.
Ainda de acordo com o ministro, essas medidas seriam usadas em troca do “término das agressões realizadas ao Brasil por meio de medidas econômicas” e como forma de impedir “que as autoridades judiciais, ministeriais e policiais brasileiras sejam apenadas pelo Executivo norte-americano”.
Em 2024, diante da iminência da aprovação da medida na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, o então presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), decidiu retirar o projeto de anistia do órgão e criar uma comissão especial para analisar o tema.
A medida foi uma forma de ganhar tempo. O seu sucessor, Hugo Motta (Republicanos-PB), sofre constante pressão da bancada bolsonarista para levar o tema a voto.
O projeto da anistia em sua última versão, relatado por Rodrigo Valadares (União Brasil-CE), estabelecia perdão aos condenados pelo 8 de janeiro de 2023, ampliando o escopo a todos os atos pretéritos e futuros relacionados aos ataques golpistas —o que, na avaliação de deputados governistas, abre margem para beneficiar Bolsonaro e os demais réus na ação penal da trama.
Caso a medida seja aprovada pelo Congresso, é praticamente certo que ela acabe sendo questionada no STF.
Em entrevista ao C-Level Entrevista, videocast semanal da Folha, o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, manifestou uma posição diferente. “Em linha de princípio, anistia é uma competência do Congresso Nacional”, afirmou ele, ressalvando que o STF poderia vir a analisar alguma medida eventualmente aprovada pelo Parlamento.
O ministro Gilmar Mendes, decano da corte, também já se manifestou sobre o projeto de anistia, declarando não ver cabimento na proposta, embora não tenha manifestado uma análise direta sobre a possível inconstitucionalidade da medida.
De acordo com balanço divulgado no início do mês pela Procuradoria-Geral da República, o STF já condenou 643 acusados de participação nos ataques à sede dos três Poderes, em Brasília.
Na última terça-feira (15), a PGR reafirmou pedido de condenação de Bolsonaro e dos outros sete réus do núcleo central da trama.
“A cooperação entre si dos denunciados para esse objetivo derradeiro, sob a coordenação, inspiração e determinação derradeira do ex-presidente da República denunciado, torna nítida a organização criminosa, no seu significado penal”, escreveu o procurador-geral da República, Paulo Gonet, no documento.
A expectativa no Supremo é que o processo sobre a tentativa de golpe de Estado esteja pronto para ir a julgamento no início de setembro.
O ex-presidente já foi condenado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é réu no STF sob a acusação de ter liderado a trama golpista de 2022. Hoje está inelegível ao menos até 2030.
Caso seja condenado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado, a pena pode passar de 40 anos de prisão.